"E assinalam a razão por que não os recebem como leis: parecem excessivamente pesados e severos, especialmente aos cristãos que estão debaixo da lei da graça. Ousam, desse modo, abolir a eterna lei de Deus quanto ao dever de se amar ao próximo? Aparece, porventura, tal distinção em alguma página da lei? E, por outro lado, porventura não ocorrem nela, a cada passo, mandamentos que mui rigidamente de nós exijem o amor para com os inimigos?" (2.8.56, p.177)
A idéia dos escolásticos é a mesma que muito mestres apresentam hoje - por estarmos debaixo da graça, não precisamos andar a segunda milha. Não existe a possibilidade de claros mandamentos serem meros conselhos, e não parte da Lei de Deus. O desafio do teólogo de Genebra não deixa dúvidas: "ou invalidem da lei estas passagens, ou reconheçam que o Senhor foi um Legislador, e não inventem que ele foi apenas um Conselheiro." (idem)
Uma evidência de que o reformador está correto encontra-se na própria história da igreja. Calvino mostra que muitos pais entenderam palavras como Mateus 5.44,45 como mandamentos. Ele cita Crisóstomo, Agostinho e Gregório o Grande. Além disso, o próprio Cristo nos diz que aquele que não ama o inimigo é como gentio e publicano. Por acaso estaria Jesus chamando sua igreja nesses termos? Outro argumento: muito mais difícil que amar os inimigos é amar a Deus da maneira como nos é exigido.
"E quão disparatadamente argumentam! Seria, insistem eles, um fardo excessivamente pesado para os cristãos. Como se de fato se possa cogitar o que quer que seja mais pesado do que amar a Deus de todo o coração, de toda a alma, de todas as forças! Diante desta lei, nada se deva ter como não fácil, seja amar o inimigo, seja alijar do coração todo desejo de vingança. Sem dúvida que à nossa insuficiência são árduas e difíceis todas as injunções, até mesmo a mais insignificante minúcia da lei." (2.8.57, p.178)
Dizer que estamos debaixo da graça e não da Lei é uma desculpa de quem não quer viver uma vida semelhante ao do nosso Senhor, o homem de dores. A graça nos capacita a andar segundo a expressão do caráter de Deus. E este caráter, antes impresso nas pedras do Sinai, agora é gravado em nosso ser.
"Ser cristão debaixo da lei da graça não é vaguear desenfreadamente sem lei, mas estar enxertado em Cristo, por cuja graça está liberado da maldição da lei e por cujo Espírito tem a lei gravada no coração." (2.8.57, p.178)
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