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Acesse pelo endereço joaocalvino.net

Comemorando os 500 anos de João Calvino, o teólogo da Reforma, este é um blog dedicado a resumir e comentar as Instituras da Religião Cristã, obra máxima do reformador de Genebra. Que ele seja útil à comunidade, seguindo a mesma intenção de Calvino ao escrever seus livros.

"Este tem sido meu propósito: preparar e instruir de tal modo os candidatos à sagrada teologia, para a leitura da divina Palavra, que não só lhe tenham fácil acesso, mas ainda possam nesta escalada avançar sem tropeços."

Esse blog está sendo desativado. Visite-nos em www.joaocalvino.net

A lei natural [ 2.2.22-23 ]

Em seções anteriores, Calvino citou três elementos que a mente humana, sem o apoio do Espírito Santo, não pode alcançar. Os dois primeiros eram o conhecimento de Deus e de seu favor, que nos leva a salvação. Agora, ele volta-se ao terceiro ponto - a lei natural - que todo ser humano carrega em si, e que serve de árbitro moral em sua vida.

"Se os gentios têm a justiça da lei da natureza gravada na mente, por certo que não diremos que são inteiramente cegos na maneira de conduzir a vida. E nada é mais generalizado que ser o homem suficientemente assistido, em relação à reta norma da vida, pela lei natural de que o Apóstolo aqui fala." (2.2.22, p.49)

No entanto, essa lei natural não dá ao homem completa norma de vida, nem o prepara para a santidade. É claro que ela é útil para que a humanidade, mesmo caída, não se autodestrua. Porém, sua finalidade maior é condenatória. O apóstolo Paulo nos explica isso em Romanos 2.1 - "Portanto, és indesculpável, ó homem, quando julgas, quem quer que sejas; porque, no que julgas a outro, a ti mesmo te condenas; pois praticas as próprias coisas que condenas" - e Calvino tem essas palavras em mente ao expor essa doutrina.

"Portanto, a finalidade da lei natural é tornar o homem inescusável. E poderíamos defini-la adequadamente dizendo que é um sentimento da consciência mediante o qual discerne entre o bem e o mal o suficiente para que os homens não prextestem ignorância, sendo convencidos por seu próprio testemunho. A indulgência do homem para consigo mesmo é que, ao perpetrar o mal, sempre e de bom grado aparta a mente do senso de pecado, até onde permissível." (2.2.22, p.50)

Muito útil nessa discussão é o que Calvino chama de "princípio de Temístio". Este filosófo grego dizia que os homens sempre têm um senso de pecado em relação a situações gerais. No entanto, para si, abre exceções, por considerar que o seu erro, naquele caso específico, é justificado. O reformador concorda - ainda que admita exceções, como veremos - com ele.

"Ninguém haverá que não afirme que o homicídio é mau, se a indagação é de cunho geral. Aquele, porém, que maquina a morte de um inimigo, delibera-a como se tratasse de uma boa coisa. O adúltero condenará o adultério em geral; entretanto o lisonjeará no seu em particular... homem se esquece dessa regra que havia há pouco estabelecido como princípio universal, quando chega a um caso particular." (2.2.23, p.50)

Esse princípio, porém, não é absoluto. Calvino nos lembra que existem pessoas que realmente praticam a maldade sabendo que fazem o mal. O reformador cita a distinção do erro humano, feita por Aristóteles, entre incontinência e intemperança. O primeiro caso é esse citado em Temístio - alguém que considera algo como mau, mas está cego quando pratica esse mal. Já a intemperança diz respeito aos que convictamente praticam o erro. Como diz Ovídio:

“Vejo as coisas melhores e as aprovo; porém sigo as piores.” (Medéia, in Metamorfose, de Ovídio, VII, 20, citado em idem)

Portanto, a obra missionária é necessária, pois a lei natural nunca levará homens à salvação, mas apenas à condenação. É necessário que o crente se esforce por isso, não confundindo a mera obediência a essa lei à verdadeira piedade, esta que só vem do Senhor.
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Bancarrota espiritual [ 2.2.20-21 ]

Adentramos finalmente em um dos principais pontos da teologia calvinista, e vemos que o reformador dedica realmente um bom tempo ao assunto - a pecaminosidade humana. Evidentemente, Calvino usará diversas passagens da Escritura para demonstrar a total inabilidade humana em relação à piedade. Ele começa com Moisés.

"Diz ele: 'Teus olhos viram aqueles sinais e portentos ingentes, e o Senhor não te deu coração para entender, nem ouvidos para ouvir, nem olhos para ver' [Dt 29.3, 4]. Que mais precisaria dizer, se no que tange à consideração das obras de Deus, nos chamou de broncos?" (2.2.20, p.47)

Em seguida o próprio Cristo deixa patente nossa bancarrota espiritual - termo usado por Lloyd-Jones.

"Cristo, por sua palavra, também confirmou isto claramente, quando dizia que ninguém podia vir a ele, a não ser aquele a quem fosse dado por seu Pai [Jo 6.44]... Portanto, ele não pôde mostrar de forma mais clara qual é nossa capacidade para conhecermos a Deus, do que quando nega que tenhamos olhos para contemplar-lhe a imagem mesmo onde tão claramente ela se exibe." (idem)

Nas palavras de Calvino, é necessário que o Espírito forme ouvidos novos em cada homem, a fim de que eles possam ouvir o Evangelho. Aliás, as figuras usadas pela Bíblia são das mais variadas. Uma das mais comuns é a comparação da regeneração com o fim da cegueira. Isso é explicitado em especial no texto de Efésios que também é exposto pelo reformador.

"Dessa forma, o que aqui detrai aos homens, só a Deus, em oração, atribui em outro lugar: 'O Deus', diz ele, 'e Pai da glória vos dê o Espírito de sabedoria e de revelação' [Ef 1.17]. Ouves já nessas palavras que toda sabedoria e revelação é dom de Deus. Então, o que diz ele em seguida a isso? 'Iluminados os olhos de vossa mente' [Ef 1.181]. Certamente, se carecem de nova revelação, é que por si mesmos são cegos. Segue-se, então: 'Para que saibais qual seja a esperança de vossa vocação' [Ef 1.18], etc. Logo, confessa que as mentes dos homens não são capazes de tão grande entendimento, ao ponto de conhecerem sua vocação." (2.2.21, p.48)

Essa doutrina, como já dissemos mais de uma vez, não é meramente uma depreciação da humanidade, mas parte do remédio necessário para a salvação do homem. Somente ao nos reconhecermos necessitados de Deus iremos ao seu encalço. Lembremo-nos sempre que Deus favorece o humilde, mas rejeita os orgulhosos.

"Se o que buscamos de Deus, confessamos assim faltar-nos, e ele próprio acusa nossa indigência naquilo que promete, que ninguém vacile em confessar que só será capaz de entender os mistérios de Deus quando tiver sido iluminado por sua graça. Quem mais entendimento se atribui, tanto mais cego e menos reconhece sua cegueira." (2.2.21, p.49)
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A miséria humana [ 2.2.17-19 ]

"Esta é a síntese: pode-se perceber em todo o gênero humano que a razão é própria à nossa natureza, a qual nos distingue dos animais brutos, assim como pela sensibilidade diferem estes das coisas inanimadas... Porque, donde procede que um seja mais eminente que outro, senão para que na natureza comum se sobreleve a graça especial de Deus, a qual, preterindo a muitos, se proclama não estar obrigada a ninguém?" (2.2.17, p.44s)

Assim, temos um resumo do pensamento de Calvino a respeito da mente humana. Ela ainda pode alcançar as alturas, mas somente porque Deus o abençoou. Como ele disse ao iniciar esse tema, a razão ainda pode aprender e produzir conhecimento sobre temas terrenos, mas não sobre temas celestiais. Sobre essa "falha" o reformador falará agora. Trata-se de uma "visão espiritual", que ele entende como formada por três tópicos:

"Conhecer a Deus, conhecer seu paterno favor para conosco, no qual se nos firma a salvação, e conhecer a maneira de plasmar a vida segundo a norma de sua lei. Quer nos primeiros dois desses pontos, quer, porém, especialmente no segundo, aqueles que dentre os homens são os mais talentosos, são mais cegos que as toupeiras." (2.2.18, p.45)

Somos totalmente incapazes de nos aproximarmos da luz de Deus por nós próprios. Por mais que o cérebro do homem possa nos dar produtos impressionantes, ele naturalmente se encontra em trevas e não pode alcançar a verdade espiritual. Isso é o que a Escritura também ensina, como os textos a seguir, citados pelo reformador nos mostram.

"Nesta passagem [João 1.4,5] indica-se certamente que a alma do homem é iluminada pelo fulgor da divina luz de tal sorte que nunca é inteiramente destituída um mínimo sequer de sua tênue chama, ou no mínimo de uma centelha, mas mesmo com essa iluminação não compreende a Deus." (2.2.19, p.46)

"Quando o Espírito chama aos homens trevas, ao mesmo tempo os despoja de toda faculdade de entendimento espiritual. Razão por que os fiéis, que a Cristo abraçam, afirma serem nascidos não de sangue, nem da vontade da carne ou da vontade do homem, mas de Deus [Jo 1.13]. Como se estivesse dizendo que a carne não é capaz de tão sublime sabedoria que possa conceber a Deus e ao que é de Deus, a não ser que seja iluminada pelo Espírito de Deus." (idem)

Essa doutrina deve nos levar à humildade, mas também deve impulsionar o empreendimento missionário. Peçamos a Deus por isso. Que sua igreja reconheça cada dia mais a pobreza em que os homens se encontram, e que essa triste constatação a leve a ser instrumento divino do resgate da humanidade com mais vigor.
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Dons do Espírito [ 2.2.15-16 ]

Uma crença popularizada no meio evangélico diz respeito aos dons espirituais, isto é, capacidades especiais recebidas pelos crentes regenerados pelo Espírito Santo. Ou seja, são dádivas dadas somente pelos crentes, uma vez que estes tornaram-se espirituais. Não nego que a doutrina seja bíblica, porém existe uma certa "gnosticalização" do conceito, ao menosprezar outros dons que também são dados por Deus e que, portanto, podem ser considerados espirituais. Para Calvino, entre eles, está a razão humana.

"Se reputarmos ser o Espírito de Deus a fonte única da verdade, a própria verdade, onde quer que ela apareça, não a rejeitaremos, nem a desprezaremos, a menos que queiramos ser insultuosos para com o Espírito de Deus. Ora, nem se menosprezam os dons do Espírito sem desprezar- se e afrontar-se ao próprio Espírito." (2.2.15, p.43)

A seguir o reformador lista as diversas conquistas humanas, em variadas áreas como filosofia, direito, medicina, matemática, entre outras. Tudo isso é fruto do dom de Deus e não deve ser rejeitado.

"Portanto, se esses homens, a quem a Escritura chama naturais [1Co 2.14], que não tinham outra ajuda além da luz da natureza, foram tão engenhosos na inteligência das coisas deste mundo, tais exemplos devem ensinar-nos quantos são os dons e graças que o Senhor tem deixado à natureza humana, mesmo depois de ser despojada do verdadeiro e sumo bem." (idem)

Claro que há falhas na razão humana, mas como foi dito, aquilo que é verdade não pode ser ignorado. Calvino considera isto como um pecado, pois rejeita-se uma dádiva do Espírito. Ele lembra que isso não significa que o Espírito habita nos ímpios só porque eles têm dons, mas que é ele quem sustenta e vivifica tudo o que há. Negar isso é cair em grave erro.

"Pois se o Senhor nos quis assim que fôssemos ajudados pela obra e ministério dos ímpios na física, na dialética, na matemática e nas demais áreas do saber, façamos uso delas, para que não soframos o justo castigo de nossa displicência, caso negligenciemos as dádivas de Deus nelas graciosamente oferecidas." (2.2.16, p.44)

Essas maravilhosas habilidades legadas por Deus não devem se tornar motivo de orgulho. O homem continua em condição miserável mesmo com tantos avanços no saber. Peçamos a Deus essa consciência.

"Não julgue ser o homem sumamente ditoso, quando se lhe concede tão grande poder de compreender a verdade sob os elementos deste mundo, deve-se, ao mesmo tempo, apreender que não só toda esta capacidade de compreensão, como também a compreensão que daí resulta, é coisa sem consistência e sem estabilidade diante de Deus, quando não subjaz nela o sólido fundamento da verdade... após a queda, foram subtraídos ao homem os dons graciosos, assim também foram corrompidos estes dons naturais que lhe restavam." (idem)
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Os dons naturais [ 2.2.13-14 ]

Resta ainda alguma coisa boa no homem? Para Calvino, a resposta não é tão simples como alguns crêem. Isto é, apenas pela bondade de Deus resta-nos alguns poucos dons naturais. Embora o homem esteja totalmente corrompido, tanto na mente quanto na vontade, e tenha se tornado escravo do pecado, ainda assim ele se diferencia dos seres irracionais. Ou seja, sobra à humanidade algumas dádivas, mantidos graciosamente por Deus. Nesse sentido, resta algo de bom nos seres humanos.

O reformador divide as nossas capacidades em dois tipos: aquelas compreendem os dons terrenos e as que compreendem dons celestiais. Evidentemente, o segundo tipo está ausente no homem caído. Conclusão: o homem pode também ser considerado totalmente mal.

"Chamo de 'coisas terrenas' aquelas que não dizem respeito a Deus e seu reino, à verdadeira justiça, à bem-aventurança da vida futura; mas, ao contrário, têm significado e nexo em relação à presente vida, e de certo modo se mantêm dentro dos limites. 'Coisas celestiais' chamo o puro conhecimento de Deus, o senso da verdadeira justiça e os mistérios do reino celeste. Na primeira classe estão a ciência política, a economia doméstica, todas as artes mecânicas e as disciplinas liberais; na segunda, o conhecimento de Deus e da divina vontade e a norma de plasmar a vida em conformidade com essa vontade." (2.2.13, p.41)

Assim, Calvino lista algumas das áreas em que esses dons de Deus ainda estão presentes. A primeira dessas é na organização da sociedade, nas leis feitas pelo homem, etc. Mesmo aqueles que quebram a ordem social seguem algum tipo de padrão e conformam-se a ele.

"Daqui resulta que não se ache ninguém que não compreenda ser conveniente que todas e quaisquer comunidades humanas sejam reguladas por leis, e que não abarque na mente os princípios dessas leis... enquanto os homens disputam entre si a respeito de capítulos das leis, estão de acordo no que tange a certa noção básica da justiça... Não obstante, isto permanece: em todos é implantada uma certa semente da ordem política. E esta é ampla prova de que na direção desta vida homem nenhum é destituído da luz da razão." (2.2.13, p.41s)

A capacidade humana também se mostra superior à de todos os outros seres também nas artes, sejam manuais ou liberais. Ora, como o homem manteria essa habilidade se não fosse dado por Deus? Não que mereçamos tamanho poder de criação, mas aprouve ao Senhor nos deixar alguma chama de razão, que permitisse isso.

"Mas, ainda que nem todos sejam aptos para aprender todas elas, todavia é marca bastante segura da energia comum o fato de que não se acha quase ninguém em quem não se evidencie proficiência em alguma arte. Nem se encontra à mão somente a energia e capacidade para aprender, mas também para inventar algo novo em cada arte, ou para aperfeiçoar e burilar o que hajas aprendido de outrem que veio antes de ti... Porque atinge indistintamente a piedosos e a ímpios, com razão se conta entre os dons naturais." (2.2.14, p.42s)

Portanto, devemos ser gratos a Deus por essa habilidades que ele nos entregou. Ainda que os injustos não glorifiquem ao Senhor por isto, que nós tenhamos os corações agradecidos diante das maravilhas que a humanidade promoveu e continuará promovendo.
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A razão humana [ 2.2.12 ]

Um aspecto fascinante dos escritos calvinistas é que, mesmo nos chamando à humildade, ele reconhece que o ser humano - mesmo caído - ainda guarda algumas das bênçãos dadas por Deus. Os dons sobrenaturais (fé, amor, santidade, entre outros), foram perdidos, enquanto a vontade e a razão, ainda que gravemente afetadas, ainda sobrevivem.

"Na natureza pervertida e degenerada do homem ainda brilham centelhas que mostram ser ele um animal racional e diferir dos brutos, porquanto foi dotado de inteligência, e todavia esta luz é sufocada por mui densa ignorância, de sorte a não poder defluir eficientemente. Assim, a vontade, porque é inseparável da natureza do homem, não pereceu, mas foi cingida" (2.2.12, p.40)

Calvino vê também que há algo no ser humano que o diferencia de todas as outras criaturas - a busca e o interesse pela verdade. Se a mente do homem tivesse sido totalmente destruída essa inclinação humana não aconteceria mais. A busca pela resposta às suas perguntas, ainda que falha, é uma marca da humanidade.

"Ora, vemos que é inerente na mente humana não sei que desejo de buscar a verdade, à qual de modo algum aspiraria, a não ser que lhe fosse anteriormente sentido algum odor. Portanto, que o homem é por natureza arrebatado pelo amor da verdade, cujo menosprezo nos animais brutos lhes argúi crasso senso, sem racionalidade, é já esta alguma perspiciência do intelecto humano; não obstante, esta predisposição, seja qual for sua natureza, desfalece antes que adentre o estádio de sua corrida, porquanto cede logo à vacuidade." (idem)

É claro que o pecado afeta a mente humana, assim como afetou a vontade. Calvino fala corretamente do costume dos homens de "investigar coisas de todo vazias e irrelevantes". No entanto, como veremos nas próximas seções, ele reconhece também o valor da inteligência humana, nas mais diversas esferas - sociedade civil, artes, ciência, entre outras. Que nos unamos ao reformador em gratidão por tantos dons divinos.
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A verdadeira humildade [ 2.2.9-11 ]

Como vimos nas seções anteriores, Calvino tem alguns restrições em relação aos patrísticos. No entanto, ele sabe que esses homens tinham boas intenções e procuravam edificar a igreja. Por isso, ele também nos diz o seguinte:

"Por mais extremados que sejam, por vezes, em exaltar o livre-arbítrio, contudo este propósito tem sido seu escopo: ensinar ao homem, inteiramente alijado da confiança de sua própria virtude, a ter sua força posta unicamente em Deus."(2.2.9, p.37)

Terminado esse estudo sobre os pais da igreja, o reformador passa a ensinar qual é a atitude correta do homem ao defrontar-se com sua própria pecaminosidade. Precisamos humildemente nos reconhecermos com indignos da bondade de Deus para alcançarmos nossa salvação.

"Todo aquele que se vê profundamente acabrunhado e consternado pela consciência de sua miséria, pobreza, nudez, ignomínia, tem assim avançado extraordinariamente no conhecimento de si próprio." (2.2.10, p.37)

Entre aqueles que abraçaram essa verdade temos Crisóstomo e, em especial, Agostinho, autor que Calvino cita diversas vezes, e realmente nos traz belíssimas reflexões.

"Da mesma forma que aquele orador, indagado qual seria o primeiro entre os preceitos da eloqüência, respondeu: a elocução; como o segundo: a elocução; também o terceiro: a elocução; assim, se me interrogas acerca dos preceitos da religião cristã, primeiro, segundo e terceiro, me agradaria responder sempre: a humildade." (Agostinho, Homília I sobre o Advento, citado em 2.2.11, p.38)

Toda essa seção é uma exortação e um alerta para que sejamos cada dia mais humilde. Que não atribuamos a nós nada além de nosso próprio pecado, que reconheçamos que tudo de bom em nós vem de Deus. Calvino e aqueles que o precederam nos deixam esse ensino, que tanta falta faz hoje na igreja.
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Uma expressão inconveniente [ 2.2.7-8 ]

Os calvinistas são conhecidos por negarem o livre-arbítrio. Mas o que significa isso? Alguns dizem que é o mesmo que tratar o homem como máquinas, mas essa é uma visão preconceituosa e caricatural. Calvino nos explica que podemos usar esse termo, pois acreditamos que o homem exerce sua vontade.

"Desse modo, pois, dir-se-á que o homem é dotado de livre-arbítrio: não porque tenha livre escolha do bem e do mal, igualmente; ao contrário, porque age mal por vontade, não por efeito de coação." (2.2.7, p.34)

No entanto, trata-se de um termo problemático, uma vez que essa vontade exercida conscientemente pelo homem está limitada pelos vis efeitos do pecado. Isto é, o homem escolhe o que deseja, mas o que deseja não vai além do mal. Ele é livre, mas serve (ainda que livremente) a um senhor - o pecado.

"Excelente liberdade, sem dúvida, seria se com efeito o homem não fosse compelido pelo pecado a servi-lo; se, no entanto, é escravo por querer, escravo por vontade, de sorte que a vontade lhe é mantida amarrada pelas peias do pecado!" (idem)

Assim, não recomenda-se a expressão "livre-arbítrio" por ser um termo problemático e carregado de pressuposições. Para ser utilizado bem, é necessário que seja definido antes. Um exemplo dessa prática encontra-se nos escritos de Agostinho. O bispo de Hipona usava o termo, mas sempre lembrando que o livre-arbítrio não é totalmente livre.

"Contudo firmemente confessa, em outro lugar, que sem o Espírito a vontade do homem não é livre, uma vez que se fez sujeita a desejos que a acorrentam e a dominam... Em outra passagem, depois de mostrar que o livre-arbítrio é estabelecido pela graça, investe asperamente contra aqueles que a si o reivindicam sem a graça." (2.2.8, p.34)

Portanto, para Calvino e Agostinho, o livre-arbítrio é, na verdade, servo. Sujeita-se a um senhor - o pecado - mas torna-se livre quando Cristo o liberta. Mas, se foi libertado, como alguém pode ser gloriar de tal liberdade? Por isso é recomendável que não usemos tal termo, na opinião de Calvino. Rejeita-se o termo não por uma negação da vontade humana, mas pela necessidade de evitar erros.
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Analisando os patrísticos [ 2.2.5-6 ]

Sobre o seguinte estudo, é bom já saber o que João Calvino pensa da maioria dos personagens que serão citados.

"Pareceu-me bem abordar, de passagem, estes dois pontos, para que o leitor já veja quanto discordo dos escolásticos mais sóbrios. Ora, dos sofistas mais recentes difiro em extensão ainda maior, a saber, quanto estão distanciado da antigüidade." (2.2.6, p.34)

Nessas seções o reformador lista algumas das idéias dos antigos teólogos a respeito da liberdade humana. Embora concorde em algum ponto ou outro, o teólogo de Genebra rejeita boa parte do que foi ensinado pelos pais. O que se percebe é que eles se preocuparam muito mais em adaptar noções filosóficas (como já foi dito) a realizar uma boa exegese da Palavra. Isso não difere muito do que muitos cristãos fazem hoje, dependendo mais de Freud e Darwin que de Moisés ou Paulo.

Vejamos alguns exemplos:

"No afã de tornar isto evidente, o autor da obra A Vocação dos Gentios enumera uma tríplice vontade: a primeira, sensória; a segunda, animal; a terceira, espiritual, das quais as duas primeiras ensinam que o homem as tem livres, sendo a última obra do Espírito Santo no homem." (2.2.5, p.33)

"Veio, porém, a prevalecer entre as escolas a distinção que enumera uma tríplice liberdade: a primeira, da necessidade; a segunda, do pecado; a terceira, da miséria, das quais a primeira é por natureza de tal forma inerente ao homem que de nenhum modo pode ser alijada; as outras duas foram perdidas mediante o pecado. De bom grado acolho esta distinção, exceto que aqui se confunde, indevidamente, necessidade com coação." (idem)

Desses escritos emerge também a idéia de dois tipos de graça em Deus - uma que coopera com nosso livre-arbítrio (já que desejaríamos, de algum modo boas coisas), e outra que é a ação única de Deus sobre nós, nos dando o desejo de querer o bem. Esses aspectos se chamariam de graça cooperante e graça operante, respectivamente. O problema dessa definição é justamente a idéia de que o homem naturalmente tem uma tendência ao bem.

"Nesta divisão desagrada-me isto: que, enquanto atribui à graça de Deus o eficaz desejo do bem, dá a entender que, já de sua própria natureza, de certo modo, ainda que ineficazmente, o homem deseja o bem. Assim Bernardo, asseverando que de fato a boa vontade é obra de Deus, no entanto concede isto ao homem: que ele deseja, de moto próprio, esta espécie de boa vontade." (2.2.6, p.33)

Como Calvino ainda não se dedicará a combater as idéias de autonomia humana, não temos aqui grandes objeções contra as doutrinas apresentadas, apenas o parecer do reformador sobre elas. O que podemos aprender é aquilo que sempre foi dito por ele - testar todas as doutrinas pelas Escrituras, a fim de nos protegermos contra pressupostos humanos.
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Os Patrísticos e o livre-arbítrio [ 2.2.4 ]

Como foi dito no final do post anterior, a maioria dos patrísticos foram influenciados pela filosofia grega, o que os levou a abraçar concepções da vontade humana que não se acomoda ao ensino bíblico. "Muitos deles, no entanto, têm se aproximado dos filósofos muito mais do que é justo" (2.2.4, p.30), lamenta Calvino, pois uma situação como essa não traz iluminação aos fiéis da igreja.

"Ademais, embora os gregos, mais que outros, e entre eles singularmente Crisóstomo, excederam o limite em exaltar a capacidade da vontade humana, contudo todos os antigos, excetuado Agostinho, nesta matéria a tal ponto ou divergem, ou vacilam, ou falam confusamente, que de seus escritos quase nada de certo se pode referir." (2.2.4, p.31)

Seguido os filósofos, os pais da igreja muitas vezes entendiam que apenas a sensibilidade ou parte sensória do homem estava debilitada pelo pecado, enquanto a razão e a vontade, muitos criam, não foram muito ou plenamente afetadas. Dessas teorias o termo livre-arbítrio é o centro. Porém, poucos dos pais se preocuparam em defini-lo, o que gera ambiguidade e confusão em seus escritos.

"Orígenes, contudo, parece ter proposto isto, acerca de que entre eles, indistintamente, havia consenso, quando disse: 'O livre-arbítrio é a faculdade da razão para discernir o bem ou o mal, a faculdade da vontade para escolher um ou outro desses dois.' Agostinho não discorda dele quando ensina que o livre-arbítrio é a faculdade da razão e da vontade pela qual, assistindo-as a graça, se escolhe o bem, deixando ela de assisti-las, escolhe-se o mal. " (2.2.4, p.32)

Resumidamente, os autores antigos ensinavam que o homem possuia a capacidade de discernir entre bem e mal (a razão). Baseados nesse discernimento tomava suas decisões. Esse ensino Calvino resume a nós, embora veremos que ele os rejeitará mais adiante.

"Estão de acordo, em primeiro lugar, em que o substantivo arbítrio se deve referir antes à razão, à qual cabe discernir entre o bom e o mau, enquanto o adjetivo livre pertence propriamente à vontade, que se pode vergar para uma ou outra dessas duas alternativas." (idem)

O que aprendemos aqui é que não devemos estar presos à tradição, pura e simplesmente. Os escritos dos antigos nos serão úteis e edificantes, mas devem sempre ser avaliados à luz da Escritura.
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Algumas advertências [ 2.2.1-3 ]

Um possível colateral para a doutrina da total depravação do ser humano é o desânimo para que se combata a carne. Por outro lado, não podemos deixar que o homem ache que possui em si qualquer capacidade de fazer o bem, que não venha pela graça. Calvino nos apresenta uma proposta quanto a isso.

"Logo, para que não nos atiremos de encontro a estes obstáculos, impor-se-á conservar este curso: que o homem, cabalmente instruído de que em seu poder nada lhe foi deixado de bom e de que de todos os lados está cercado da mais miserável necessidade, no entanto seja ensinado a aspirar ao bem, de que é carente; e à liberdade, de que foi privado; e assim seja mais incisivamente despertado da inação, do que se imaginasse ser dotado de suprema virtude." (2.2.1, p.27)

Calvino sempre se mostrou um leitor (e até apreciador) dos filósofos gregos. Assim, antes de mostrar o que os patrísticos diziam sobre a liberdade humana, ele fala dos representantes da filosofia. Sua conclusão é que nenhum conseguiu entender corretamente o que significa o homem tender ao erro.

"Ora, dizem eles, se é de nossa escolha fazer isto ou aquilo, logo também o não fazê-lo. Por outro lado, se é de nossa escolha o não fazê-lo, logo é também fazê-lo. Mas parecemos fazer de livre escolha as coisas que fazemos e absternos daquelas das quais nos abstemos. Portanto, se algo de bom fazemos quando nos apraza, podemos igualmente deixar de fazê-lo; se algo de mau perpetramos, podemos também evitá-lo." (2.2.3, p.29)

A conclusão que chegamos sobre o ensino filosófico não é muito animadora. A maioria deles só considerava a "sensibilidade" como algo que tendia ao mal. As outras características humanas não apresentavam falhas, mas podiam guiar o homem à bondade. O reformador rejeita esse ensino, que ele resume da seguinte forma:

"Portanto, esta é a suma da opinião de todos os filósofos: que para a reta direção do ser basta a razão do intelecto humano; que a vontade a ela subjacente é, com efeito, pela sensibilidade solicitada às coisas más. Entretanto, visto que tem livre escolha, de modo algum pode ser impedida de por tudo seguir a razão como guia." (2.2.3, p.30)

O mais triste é que a igreja raramente ouve os alertas de Calvino e, sem perceber, acaba abraçando o ensino grego. Isso se comprovará nas próximas seções, quando Calvino analisará o ensino patrístico. É hora de dar ouvidos a essas advertências e não se deixar enganar por vãs especulações.
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A origem da corrupção [ 2.1.10-11 ]

Finalizando o primeiro capítulo do Livro 2, Calvino gasta mais tempo para deixar claro que o pecado é culpa do homem, e não de Deus. Novamente ele se volta para a questão da impiedade ser um problema de corrupção da natureza humana, não da própria natureza.

"Lembremo-nos de que nossa ruína deve ser imputada à depravação de nossa natureza, não à natureza em si, em sua condição original, para que não lancemos a acusação contra o próprio Deus, como sendo o autor dessa natureza." (2.1.10, p.25)

O texto de Gênesis nos diz que o Criador observou suas obras criadas e avaliou positivamente tudo o que foi feito, em especial o homem. De fato precisamos entender isso - o ser humano é bom pois foi criado por Deus e por ter sido avaliado positivamente pelo mesmo. Claro que isso se passa antes da Queda, mas o pecado é obra nossa não de Deus. Nós nos fizemos inimigos do Criador por nossa própria culpa.

"Negamos que essa depravação tenha se originado da própria natureza como tal, para que deixemos claro que ela é antes uma qualidade adventícia que sobreveio ao homem, e não uma propriedade substancial que tenha sido congênita desde o princípio... Como poderia Deus, a quem uma a uma comprazem suas mínimas obras, ser inimigo da mais nobre de todas as criaturas? Deus, porém, é antes inimigo da corrupção de sua obra, e não da própria obra." (2.1.11, p.26)

Esse ensinamento é importante, pois combate a heresia dos maniqueus. Os mestres dessa seita não podiam aceitar que existisse algo de mau em um ser criado por Deu, e por isso tentaram criar sua própria explicação para isso. Surgiu daí a idéia de entidades menores que foram responsáveis pela formação do homem, algo certamente não-bíblico.

"Assim dissipa-se a tola baboseira dos maniqueus que, como no homem imaginassem malignidade intrínseca, ousaram anexar-lhe um outro criador, para que não parecessem atribuir ao Deus justo a causa e o princípio do mal." (idem)

Não precisamos apelar para especulações se queremos explicar a corrupção humana.A Bíblia proveu todas as respostas, de maneira que o crente piedoso poderá obtê-las com estudo e dedicação.
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Depravação total [ 2.1.8-9 ]

Calvino inicia a nova seção definindo o que ele quer dizer por pecado. Mais uma vez, vemos a importância que o reformador dava a não deixar qualquer ensino ambíguo ou exposto a interpretações errôneas. Como é comum em seus escritos, trata-se de uma definição dupla.

"O pecado original representa, portanto, a depravação e corrupção hereditárias de nossa natureza, difundidas por todas as partes da alma, que, em primeiro lugar, nos fazem condenáveis à ira de Deus; em segundo lugar, também produzem em nós aquelas obras que a Escritura chama de 'obras da carne' [Gl 5.19]. E é propriamente isto o que por Paulo, com bastante freqüência, designa apenas de pecado." (2.1.8, p.23)

A doutrina da Depravação Total, conhecida como o primeiro ponto do Calvinismo, é exposta pelo reformador - ainda que ele não use esses termos. Isso demonstra que os teólogos reformados não colocaram palavras na boca de Calvino, mas na verdade resumiram os seus ensinamentos.

"Tudo quanto há no homem, desde o intelecto até a vontade, desde a alma até a carne, foi poluído e saturado por essa concupiscência. Ou, para expressar-se mais sucintamente, o homem todo, de si mesmo, outra coisa não é senão concupiscência." (2.1.8, p.24)

De fato o "total" dessa doutrina não quer dizer que os homens são tão maus quanto podem ser, mas que todas as esferas de seu ser foram infectadas pela impiedade. Mais a frente (2.1.9, p.25), Calvino dirá que não é simplesmente o corpo ou a alma que precisa da graça, mas o homem por completo. Nossa situação é tão desesperadora que mesmo aqueles que parecem mais inocentes estão tomados por esse mal e são, portanto, culpadas.

"E por isso também as próprias crianças, enquanto trazem consigo sua condenação desde o ventre materno, são tidas como culposas não por falta alheia, mas pela falta de si próprias. Ora, embora ainda não tenham trazido à tona os frutos de sua iniqüidade, no entanto têm encerrada dentro de si a semente." (idem)

Para alguns, esse ensinamento é ofensivo e precisa ser evitado. Mas isso é um erro. Essa doutrina aterradora e tão difícil de suportar não deve nos fazer mal, mas nos levar ao reconhecimento da necessidade do poder de Deus em nossas vidas. É somente pela graça que poderemos vencer essa corrupção, e é somente reconhecendo-nos com fracos e sujos que teremos acesso a esta maravilhosa regeneração. Não sejamos arrogantes, mas humildes.
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A natureza corrompida [ 2.1.6-7 ]

A relação entre Adão e sua posterioridade é desenvolvida por Calvino nas próximas seções. Tomando os temas que o apóstolo Paulo desenvolve em sua carta aos Romanos, o reformador explica a depravação humana com a dicotomia Adão/Cristo. Se a justiça de Cristo não nos vem por imitação, segue que o pecado de Adão também não caiu sobre nós dessa forma.

"Porque, se está fora de controvérsia que, mediante comunicação, a justiça de Cristo é nossa, e desta a decorrer a vida, segue-se, ao mesmo tempo, que em Adão foram ambas assim perdidas, como em Cristo ambas são recuperadas... E por isso, entre estes dois [Cristo e Adão], a relação é esta: que este, a nós envolvendo em sua ruína, consigo nos perdeu; Aquele, por sua graça, nos restituiu à salvação." (2.1.6, p.21)

No entanto, é necessário nos lembrarmos que não é o homem algo ruim em si mesmo. Por ser criado por Deus, o ser humano é uma criatura boa. Porém, o pecado o torna corruptível, e desgradável ao Criador. Calvino novamente nos adverte a não cairmos nessa heresia.

"Depreende-se facilmente que por certo aqui não se deve entender natureza como foi criada por Deus; antes, como foi corrompida em Adão, pois que estaria muito longe de ser procedente que Deus se fizesse o autor da morte." (2.1.6, p.22)

Há um outro problema comum quando se trata desse tema, a respeito da transmissão hereditária dessa corrupção. Muito debateu-se sobre como essa depravação é passada aos descendentes. Calvino dá uma resposta simples para o assunto - Deus revogou os dons que havia dado ao homem, e isso nos basta saber.

"A nós nos convém estar contentes com isto: haver o Senhor depositado em Adão aqueles dotes que quis conferir à natureza humana. Portanto, quando perdeu os dotes recebidos, aquele os perdeu, não apenas por si só, mas também por todos nós." (2.1.7, p.22)

Por fim, o reformador volta a atacar a heresia pelagiana, que ensinava que existe uma transmissão da pureza de pais regenerados para seus descendentes, livrando-os assim da corrupção humana. Essa idéia não tem base bíblica e nem mesmo os pais da igreja a apoiavam.

"Ora, não descendem da regeneração espiritual, mas da geração carnal. Daí, como diz Agostinho: 'Quer um infiel culposo, quer um fiel inculpável, um e outro não gera inculpáveis, mas culposos, porque os gera de natureza corrupta'... Pois, a culposidade provém da própria natureza; a santificação, contudo, procede da graça supernatural." (2.1.7, p.22s)

Deixemos a Bíblia falar mais alto que nosso orgulho e vãs especulações. Que a igreja abandone o pelagianismo que abraçou e volte-se novamente para essa maravilha graça sobrenatural!
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Os filhos de Adão [ 2.1.5 ]

Seguindo a queda de Adão, passamos a tratar das consequências dessa desobediência sobre nós. Ao pecar, o homem acabou transmitindo aos seus descendentes a maldição da morte.

"'Gemem todas as criaturas', diz Paulo, 'não por sua própria vontade, sujeitas à corrupção' [Rm 8.20, 22]. Caso se busque a causa disso, não há dúvida de que estão a sofrer parte daquele castigo que o homem mereceu, para cujo proveito elas foram criadas. Portanto, quando, de alto a baixo, por sua culpa atraiu a maldição que grassa por todos os recantos do mundo, nada há de ilógico se ela foi propagada a toda sua descendência." (2.1.5, p.20)

Chesterton já disse que o pecado é a doutrina cristã que podemos mais efetivamente demonstrar. De fato, essa "corrupção hereditária" (idem) é inata a todos os seres humanos, como filhos dos primeiros seres humanos. Assim, não se sustenta a opinião de Pelágio, de que somos pecadores por imitação e não por uma deformação em nossa natureza.

"Naturalmente, com esta artimanha de encobrir a enfermidade, Satanás tentou torná-la incurável. Como, porém, pelo claro testemunho da Escritura se mostrasse que o pecado foi transmitido do primeiro homem a toda a posteridade [Rm 5.12], sofismavam haver-se transmitido por imitação, não por geração."(idem)

No entanto, a Bíblia não nos permite tirar essa conclusão - de que o homem nasce puro, para depois "aprender" o que é o pecado. Além do já citado texto de Romanos 5.12, Calvino nos apresenta mais algumas provas, como veremos adiante.

"Por certo que não é ambíguo o que Davi confessa, a saber, ter sido gerado em iniqüidades e de sua mãe concebido em pecado [Sl 51.5]. Não está ele aí a censurar as faltas do pai ou da mãe; antes, para que melhor enalteça a bondade de Deus para consigo, faz remontar a confissão de sua iniqüidade à própria concepção." (idem)

"Portanto, todos que descendemos de uma semente impura, nascemos infeccionados pelo contágio do pecado. Na verdade, antes que contemplemos esta luz da vida, à vista de Deus já estamos manchados e poluídos. Pois, “quem do imundo tirará o puro?” Certamente, como está no livro de Jó [14.4], ninguém!" (idem)

Negar a corrupção humana é uma das heresias que mais atacam a igreja. Ao minimizar os efeitos da queda em nós, corrermos o risco de não encarar de frente o problema da humanidade. Corremos o risco de desvalorizar a obra de Cristo e a graça de Deus. O Senhor nos livre desse erro trágico.
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O pecado de Adão [ 2.1.4 ]

Para começar a falar sobre o Redentor e a necessidade dele (tema do segundo livro das Institutas), é preciso primeiro falar sobre o pecado. E daí é importante que lidemos com o assunto desde seu início - quando o homem caiu. Calvino discorre sobre a natureza desse evento tão infeliz para a humanidade.

"A proibição da árvore do conhecimento do bem e do mal foi um teste de obediência; de modo que, ao obedecer, Adão podia provar que se sujeitava à autoridade de Deus, de livre e deliberada vontade. Com efeito, o próprio nome da árvore evidencia que o propósito do preceito não era outro senão que, contente com sua sorte, o homem não se alçasse mais alto, movido de ímpia cobiça." (2.1.4, p.18)

Mais do que isso, a queda do homem foi um ato de ambição e ingratidão. O homem recusou aquilo que Deus lhe deu como suficiente para si e quis mais do que devia.

"Ignobilmente Adão desdenhou a tão grande liberalidade de Deus pela qual havia sido enriquecido. Na verdade, esta foi uma impiedade monstruosa, a saber, a um filho da terra parecer pouco que fosse criado à semelhança de Deus, se também não lhe fosse acrescentada a igualdade." (2.1.4, p.19)

Concluindo, o reformador mostra que esse ato de desobediência de Adão também significou uma forma de blasfêmia, por desmerecer as palavras do Criador e elevar as palavras da serpente como verdadeiras. Com isso, Calvino conclui, ao melhor estilo John Piper, o homem perdeu o status de mais alta felicidade.

"Ora, jamais teria Adão ousado repudiar o imperativo de Deus, a não ser que não lhe desse crédito à palavra. Era este, de fato, o melhor freio para adequadamente regular-lhe todas as inclinações: que nada é melhor do que, mercê de estrita obediência aos preceitos de Deus, amar a justiça; em seguida, que a meta final da vida feliz é ser por ele amado." (idem)
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O conhecimento do homem [ 2.1.1-3 ]

O assunto do conhecimento volta à tona nesse início do livro 2 das Institutas. Um dos propósitos de todo esse projeto de Calvino é que homens e mulheres também conheçam mais sobre si, visto que para ele nosso conhecimento total e proveitoso basicamente consiste nisso - em conhecer Deus e conhecer a nós mesmos (vide seção 1.1.1). O reformador nos diz que este conhecimento do homem possui duas partes - antes e pós-queda.

"O conhecimento de nós mesmos situa-se, em primeiro lugar, nisto: que, atentando para o que nos foi outorgado na criação, e quão benignamente Deus continua sua graça para conosco, saibamos quão grande seria a excelência de nossa natureza, se porventura permanecera íntegra, contudo ao mesmo tempo reflitamos que em nós nada subsiste de próprio... Em segundo lugar, que encaremos bem a miserável condição em que nos achamos após a queda de Adão, por cujo reconhecimento, posta por terra toda jactância e confiança própria, esmagados de vergonha, verdadeiramente nos humilhemos." (2.1.1, p.15)

No entanto, algo que se coloca como barreira a esse conhecimento é o orgulho humano. Calvino lembra que "nada há que a natureza humana mais cobice que ser afagada por lisonjas" (2.1.2, p.16), o que se torna um problema quando se deve contemplar a maldade e pecaminosidade dos seres humanos. Somente quando reconhecermos nossa inabilidade humildemente buscaremos essa ciência.

"Aos que confiam poder fazer algo de sua própria capacidade não pode suceder de outra maneira. Portanto, se alguém dá ouvidos a tais mestres que nos incitam a tão-somente mirarmos nossas boas qualidades, não avançará no conhecimento de si próprio; ao contrário, se precipitará na mais ruinosa ignorância." (2.1.2, p.17)

O reformador também nos dá um alerta. Deus não quer que ignoremos as características do homem antes da queda. É costume, especialmente entre os reformados, dá tanta ênfase na natureza caída do homem que muitos acabam considerando a humanidade como a pior das obras de Deus. Calvino rejeita essa distorção, lembrando que saber como era Adão originalmente nos leva a ansiar mais ainda pela presença de Deus conosco.

"Tampouco quer Deus que nos esqueçamos de nossa nobreza primeva, nobreza que conferira a nosso pai Adão, nobreza que por certo deve, com razão, despertar nosso zelo pela justiça e pela bondade. Pois não podemos sequer pensar, seja em nossa própria condição original, seja para quê fomos criados, que não sejamos acicatados a meditar na imortalidade e a anelar pelo reino de Deus." (2.1.3, p.17)

Sobre esses propósitos para conhecer-se, Calvino tem mais a dizer, algo que ele divide em dois propósitos básicos - "que o homem reconheça qual seja seu dever" e "de que recursos dispõe para desempenhá-lo" (2.1.3, p.18) . Ele explica esses conceitos dessa forma.

"Em primeiro lugar, considere para que fim foi criado e provido de dotes que não se deve desprezar, mercê de cuja reflexão se desperte à meditação do culto divino e da vida futura; em segundo lugar, pondere suas capacidades; ou, de fato, sua carência de capacidades, a qual, uma vez percebida, se prostre em extrema confusão, como que reduzido a nada." (idem)

Portanto, é importante que tenhamos em vista a proposta de Calvino para uma antropologia bíblica. Ela não deve ser mera informação, mas algo que nos leve a ansiar pelos céus e nos faça aprender em humildade. Que nossos teólogos possam também pensar assim.
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A instrumentalidade dos ímpios [ 1.18.4 ]

Finalizado o assunto da providência (e o Livro 1 das Institutas), Calvino novamente defende a fé cristã de ataques antibíblicos. Para alguns, Deus deve ser considerado o autor de todos os pecados, uma vez que ele decreta e age sobre os ímpios para alcançar seus propósitos. Essa última seção objetiva a combater essa objeção. Como dissemos no post anterior, trata-se de uma confusão entre vontade e preceito.

"Isto nos cabe realmente sustentar: enquanto por instrumentalidade dos ímpios Deus leva a bom termo o que decretou em seu juízo secreto, não são eles escusáveis, como se estivessem obedecendo a seu preceito, o qual deliberadamente violam em sua desregrada cupidez." (1.18.4, p.229)

Novamente Calvino usa do auxílio de Agostinho para defender essa doutrina que ele já expôs por bastante tempo. Chama atenção essa boa influência na vida do reformador, ainda que ele rejeite aquilo que discorda do bispo de Hipona. O argumento é o que já dissemos no estudo anterior - Deus e o homem diferem em seus objetivos para um mesmo ato.

"Uma vez que o Pai haja entregado o Filho, e Cristo seu corpo, e Judas o Senhor, por que nesta entrega Deus é justo e o homem réu, senão porque, em um e o mesmo ato que praticaram, a causa em função da qual o praticaram não é uma e única?" (Agostinho, Epístola XLVIII (93), a Vicente, capítulo 7, citado em 1.18.4, p.230)

A respeito do controle de Deus sobre a morte de seu próprio Filho, o reformador tem a dizer o mesmo que Santo Agostinho. Por fim, conclui - as intenções dos ímpios acabam os condenando, por mais que sejam eles instrumentos da bondade de Deus. Ninguém pratica o mal por ordem do Senhor.

"Certamente que, na traição de Judas, atribuir a Deus a culpa do ato nefando, visto que ele próprio não só quis que o Filho fosse entregue, como inclusive o entregou à morte, em nada será mais lícito que transferir a Judas o louvor da redenção... neste exame Deus não indaga o que os homens têm podido, ou o que têm feito, porém o que têm querido, de sorte que o que se leva em conta é o propósito e a vontade." (1.18.4, p.231)

Conclusão do Livro 1

Aprendemos muitas coisas nesse ensino piedoso que Calvino nos traz. Dessas, destaco algumas que devemos manter conosco ao fechar esse tomo das Institutas: que o conhecimento de Deus é necessário para nossa felicidade, que a Escritura é a fonte primordial desse conhecimento vivo e dinâmico, e que o Criador também controla tudo por meio de seu poder e sabedoria. Que estejamos dispostos a sorver cada vez mais da Palavra de Deus.

"Ora, nosso saber não deve ser outra coisa senão abraçar com branda docilidade, e certamente sem restrição, tudo quanto foi ensinado nas Sagradas Escrituras." (idem)
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A vontade única de Deus [ 1.18.3 ]

Antes de tudo, um grande alerta àqueles que tentam diminuir ou fugir da doutrina da providência.

"Ora, se com falsa aparência de ignorância anelam ao louvor da modéstia, que de mais altivo se pode imaginar que opor à autoridade de Deus uma opiniãozinha insignificante: 'Meu parecer é outro', ou: 'Não me agrada abordar isso'? Se ao contrário se põem abertamente a maldizer, que proveito fruirão arremetendo-se contra o céu a cuspir?" (1.18.3, p.227)

Calvino enfrenta agora a objeção daqueles que dizem que ensinamos Deus ter duas vontade, como se fizesse as coisas mesmo sem o querer, ou desejasse o que não deseja. Para o reformador, essas pessoas simplesmente fazem confusão entre vontade e preceito. O reformador rejeita a idéia de vontade dúbia do Criador, mesmo que a nós pareça muitas vezes isso. Ele usa como exemplo maior do controle de Deus a crucificação de Jesus.

"E, com efeito, a não ser que Cristo houvesse sido crucificado porque Deus assim o quis, donde teríamos redenção? Contudo, nem por isso Deus se põe em conflito consigo mesmo, nem se muda sua vontade, nem o que quer finge não querer; todavia, embora nele sua vontade seja uma só e indivisa, a nós parece múltipla, já que, em razão da obtusidade de nossa mente, não aprendemos como, de maneira diversa, o mesmo não queira e queira que aconteça." (1.18.3, p.228)

Para reforçar sua idéia, Calvino apela novamente aos escritos de Agostinho, demonstrando que sua doutrina não idéia nova, mas algo que vem desde os tempos antigos. Trata-se de uma citação longa, mas que ilustra bem como conciliar essa a providência de Deus com o (mal) querer humano.

"Por vezes, com uma vontade boa, um homem quer algo que Deus não quer, como, por exemplo, se um bom filho quer que o pai viva, a quem Deus quer que morra; por outro lado, pode acontecer que, de má vontade, um homem queira o mesmo que, de boa vontade, Deus quer, como, por exemplo, se um filho mau queira que o pai morra, e isso também Deus queira. Isto é, aquele quer o que Deus não quer; este, porém, quer o que também Deus quer. E no entanto a piedade daquele, ainda que a querer coisa diferente, mais se coaduna com a vontade boa de Deus, do que a impiedade deste a despeito de querer o mesmo. Tanto importa que seja próprio ao homem querer, que o seja a Deus, e a que fim se inclina a vontade de cada um, de sorte que ou seja aprovada ou seja reprovada. Ora, mediante as vontades más de homens maus Deus executa o que quer de boa vontade." (Agostinho, Inquirição a Lourenço, cap 101, citado em idem)

Isto é, um homem deseja o mal e ainda assim o que ele deseja é o mesmo que Deus deseja, porém com Deus o desejando para o bem. Trata-se de uma questão de intenções, muito mais que de ações (pois estas são praticadas por cada agente, não sendo Deus o executor dos atos maus). Como Deus sempre quer o bem e a justiça, sua glória é mantida, e sua santidade continua imaculada.

"E assim, de maneira mirífica e inefável, não se faça, exceto por sua vontade, o que se faz mesmo contra sua vontade, porque não se faria se ele não o permitisse; nem o permite, como se de qualquer forma não o quisesse; ao contrário, porque o quer; mesmo sendo bom não permitiria que mal se fizesse, exceto que, onipotente, até em relação ao mal pudesse fazer
bem." (Agostinho, citado em 1.18.3, p.229)

Novamente, nossa oração que sejamos humildes e aceitemos de bom grado essa doutrina que a Bíblia nos ensina, e que os pais com todo cuidado expuseram para nós.
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A eficiência da providência [ 1.18.1-2 ]

Calvino volta-se novamente para a questão dos decretos de Deus em relação aos maus atos cometidos. Ele fala da popular distinção entre Deus fazer e permitir certo evento, para então negar que haja base para supor isso. Os atos malignos também são decretados por Deus, mas ele não se mancha com isso. Um dos exemplos claros está em Jó, que foi atacado por Satanás, mas associou a Deus o que aconteceu com ele, sem que houvesse qualquer objeção da Escritura.

"Jó reconhece que da parte de Deus fora despojado de todos os seus haveres e em pobre transformado, pois assim aprouvera a Deus. Portanto, seja o que for que os homens maquinem, ou o próprio Satanás, entretanto Deus retém o timão, de sorte que lhes dirija os propósitos no sentido de executarem seus juízos... Seria ridículo que o Juiz apenas permitisse o que queria que fosse feito, contudo não o decretasse e não determinasse a execução aos serventuários." (1.18.1, p.224)

Para Calvino, é um absurdo considerar a idéia de que Deus fica apenas "assentado numa guarita" (1.18.1, p.225), dependendo do que os homens decidem fazer ou nao, para executar seus decretos. Pelo contrário, a mente do homem é dirigida pelo Senhor para seus propósitos. Mesmo na condenação dos réprobos vemos o Espírito como causa eficiente.

"Muitos, porém, lançam estes fatos à conta da permissão, como se, ao rejeitar aos réprobos, Deus os deixasse entregues a Satanás para que os cegasse. Todavia, uma vez que o Espírito Santo declara expressamente que cegueira e insânia são infligidas pelo justo juízo de Deus [Rm 1.20-24], essa solução se torna muitíssimo frívola." (1.18.2, p.225)

Calvino cita o caso de Faraó, onde a Bíblia ensina que Deus endureceu o coração do inimigo dos judeus, ao mesmo tempo que deixa claro que o vilão também estava agindo. Trata-se de uma relação praticamente sinergista, em que o Senhor sustenta e guia os maus desígnios do pecador para seus propósitos. De fato, o reformador nos lembra que se não for assim, como poderia o coração de Faraó ter se endurecido mais ainda?

"Como se, na verdade, se bem que de modos diversos, não se harmonizem perfeitamente bem entre si estes dois fatos: que o homem, quando é acionado por Deus, contudo ele, ao mesmo tempo, está também agindo. Eu, porém, lanço contra eles o que objetam, porque, se endurecer denota permissão absoluta, o próprio impulso da contumácia não estará propriamente em faraó. Com efeito, quão diluído e insípido seria interpretar assim, como se faraó apenas se deixasse endurecer!" (1.18.2, p.226)

Assim, é necessário que aceitemos essa doutrina. Deus não precisa de defensores, mas quer que anunciemos sua verdade, por mais dolorosa que seja aos nossos ouvidos antropocêntricos. O Rei do Universo comanda todos conforme sua vontade, sem se deixar sujar pelo pecado. Isso pode ser difícil de compreender para alguns, mas é o que a Palavra nos apresenta. Que nos submetamos a ela, então.
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Arrependimento de Deus? [ 1.17.12-14 ]

"Muitos daqui argúem que Deus não fixou os afazeres humanos por um decreto eterno; ao contrário, para cada ano, dia e hora, um a um, decreta isto ou aquilo, segundo são os méritos de cada indivíduo ou conforme o julgue reto e justo." (1.17.12, p.220)

Se Deus decreta tudo o que acontece, como vemos passagens onde a Escritura afirma que Deus arrependeu-se de certas ações, ou que ele mudou seu decreto baseado em ações humanas? Essas questõs Calvino responderá nas últimas seções desse longo capítulo sobre a providência.

Primeiramente, ele trata da questão do arrependimento de Deus. Para o reformador, a Bíblia deixa bastante claro que Deus não comete erros para arrepender-se. Calvino lembra que num mesmo capítulo a Bíblia usa a expressão arrependimento para Deus, para logo em seguida dizer que o Senhor não arrepende-se (1Sm 15). Assim, devemos entender essa palavra, quando usada para Deus, como um antropomorfismo.

"Esta é, na verdade, a forma de acomodação: que se representa, não tal como é em si, mas como nós o sentimos... assim também não devemos conceber outra coisa sob o vocábulo arrependimento senão a mudança de ação... pelo termo arrependimento se entende o que Deus muda em suas obras. Entretanto, não se reverte nele nem o plano, nem a vontade, nem se oscila seu sentimento. Ao contrário, o que desde a eternidade previra, aprovara, decretara, leva adiante em perpétuo teor, por mais súbita que a variação pareça aos olhos dos homens." (1.17.13, p.220s)

Sobre a mudança de decisão que Deus toma sobre certos assuntos, como, por exemplo, a não-destruição de Nínive no livro de Jonas, o reformador também tem muito a nos dizer. Existem ações que Deus quer tomar, mas que têm as reações dos seres humanas como meios para chegarem a elas. Isto é, para salvar Nínive, é necessário propor o arrependimento por meio da ameaça de destruição. Deus iria salvar a cidade, mas era necessário levar aquele povo ao reconhecimento de seus erros.

"Quem não percebe que, mediante ameaças desta ordem, o Senhor queria despertar ao arrependimento àqueles a quem infundia medo, para que escapassem ao juízo de que, por seus pecados, eram merecedores?" (1.17.14, p.221)

Da mesma maneira, quando Deus nos exorta a mudarmos nossos caminhos, é preciso saber que ele tem prazer em levar-nos ao arrependimento, e não deseja o castigo de seus filhos. Nosso Pai está pronto a perdoar e retém suas maldições se humildemente nos voltamos para ele diante de uma advertência.

"Pois o Senhor aplaina o caminho para sua eterna determinação quando, anunciando o castigo, exorta ao arrependimento àqueles a quem quer poupar, antes que algo varie em sua vontade, e certamente não em sua palavra, exceto que não exprime, sílaba a sílaba, o que entretanto é fácil de entender." (1.17.14, p.222)
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Mais sobre a providência [ 1.17.9-11 ]

A doutrina da providência nos provoca mansidão e serenidade, por sabermos que Deus tem o controle do bem e do mal. Porém, Calvino nos mostra que aquele que entende corretamente essa doutrina não passa a viver em passividade, negando-se a ser prudente só porque Deus é soberano. Da mesma maneira, devemos entender que as causas secundárias de uma bênção não devem ser desprezadas.

"Enfim, nos benefícios recebidos reverenciará e louvará a Deus como seu principal autor, porém honrará aos homens como seus ministros e, como é de fato, compreenderá haver sido ligado pela vontade de Deus àqueles por cuja mão ele quis ser-lhes benévolo... Daí também não cessará de tomar conselhos, nem haverá de ser lerdo em implorar a assistência daqueles a quem perceberá disporem de meios donde haja de ser ajudado. Ao contrário, considerando que à mão se lhe oferecem da parte do Senhor todas e quaisquer criaturas que lhe podem prover algo, as porá para o uso como instrumentos legítimos da providência divina." (1.17.9, p.215s)

Além disso, o homem piedoso também não culpará Deus pelos seus próprios erros ou imprudência, mas aceitará o infortúnio como fruto de seu vacilo. Devemos dar o nosso melhor, mas lembrando-nos sempre que existe um Criador que tudo governa. O reformador utiliza o ótimo exemplo de Joabe para exemplificar essa atitude.

"Assim é que Joabe, ainda que reconheça que o resultado da batalha está no arbítrio e mão de Deus, contudo não se entrega à inércia, mas executa diligentemente o que lhe é da alçada; deixa, porém, ao Senhor a direção do resultado: “Erguernos- emos firmes”, diz ele, “por nosso povo e pelas cidades de nosso Deus; o Senhor, porém, faça o que é bom a seus olhos” [2Sm 10.12]." (idem)

Calvino também reconhece que, debaixo de tantos periogos que envolvem nosso cotidiano, a condição humana muitas vezes é triste e lamentável. Depois de uma lista de inúmeros problemas que podem nos ocorrer, ele conclui.

"Em meio a estas dificuldades, porventura não deve o homem sentir-se em extremo miserável, como quem na vida apenas semivivo sustenta debilmente o sôfrego e lânguido alento, não menos que se tivesse uma espada perpetuamente a pender-lhe sobre o pescoço?" (1.17.10, p.217)

No entanto, ele chega à conclusão de que existe algo pior que todo o tipo de maldição conhecida. E é essa que devemos primeiramente evitar.

"Enfim, para que aqui não me demore por mais tempo, se prestares atenção perceberás facilmente que o extremo de todas as misérias é o desconhecimento da providência, e que a suprema bem-aventurança está posta em seu reconhecimento." (1.17.11, p.219)

Que possamos usar essa doutrina tão bendita como algo que nos faça crescer em graça, e não como um motivo para indolência. Amém.
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Benefícios da providência [ 1.17.6-8 ]

A doutrina da providência sempre traz aos homens mais curiosidade que conforto. Esse é um engano perigoso, pois Deus nos ensina doutrinas para que confiemos cada dia mais nele. É por esse motivo que Calvino dedica os próximos trechos a mostrar os benefícios que recebemos se aceitarmos de maneira correta esse ensino bíblico.

"Este é o principal propósito nas histórias bíblicas: ensinar que os caminhos dos santos são guardados pelo Senhor com zelo tão ingente, que nem sequer em pedra tropeçam [Sl 91.12]." (1.17.6, p.212)

Essa certeza nos levará à gratidão quando somos abençoados, mas também será fonte de conforto e mansidão quando nos sentirmos oprimidos por algum mal que vem a nós, seja um mal natural, uma doença, o mal dos homens, e "até mesmo o próprio Diabo, a quem vemos não ousar nada intentar contra Jó, sem sua permissão e mandado" (1.17.7, p.213). Quando estivermos desanimados ou irados as palavras de Calvino podem nos lembrar para quem direcionar nossa mente.

"Se nenhum remédio é mais eficaz para a ira e a impaciência, certamente que frui não pouco proveito aquele que, neste aspecto, assim aprendeu a meditar a providência de Deus, que pode sempre volver a mente para este ponto: o Senhor o quis, portanto é necessário ter paciência e suportá-lo; não só porque é possível resistir, mas porque ele nada quer senão o que é justo e conveniente."(1.17.8, p.214)

Devemos agir de maneira semelhante a Cristo, que não revidou, mas sabia que o Pai tinha tudo sob controle. Essa serenidade de Jesus vinha da certeza de que a soberania de Deus age sobre todos, e a providência usa até o inimigo. É nossa oração buscar esta fé que traz mansidão ao coração.

"A suma vem a ser isto: que, feridos injustamente pelos homens, posta de parte sua iniqüidade, que nada faria senão exasperar-nos a dor e acicatar-nos o ânimo à vingança, nos lembremos de elevar-nos a Deus e aprendamos a ter por certo que foi, por sua justa adminitração, não só permitido, mas até inculcado, tudo quanto o inimigo impiamente intentou contra nós." (idem)
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