Para Calvino, isso é uma tentativa de negar a imortalidade da alma e a existência de Deus, pois muitas das capacidades que o homem tem não dizem respeito a seu corpo, e vão muito além das meras funções orgânicas.
"Ao contrário, a alma tem suas propriedades distintas do corpo... A multiforme agilidade da alma, com que perscruta o céu e a terra, liga as coisas passadas às que estão por vir, retém em lembranças as coisas que há muito ouviu, até mesmo para si pinta o que bem lhe apraz, assim também a habilidade com que imagina coisas incríveis, e que é a matriz de tantas invenções admiráveis, são seguros sinais da Deidade no homem." (1.5.5, p.59)
Antecepiando em alguns séculos o argumento moral de C.S. Lewis, o reformador questiona como podemos creditar certas faculdades ao homem, entre elas, a habilidade de identificar o certo e errado.
"Como feito, nós, em função da capacidade judicatória que nos foi outorgada, faremos distinção entre o justo e o injusto, porém nenhum juiz no céu haverá? A nós, até mesmo durante o sono, nos remanescerá certo resíduo de entendimento; Deus nenhum, porém, estará de vigia a reger o mundo?" (1.5.5, p.59)
Por fim, Calvino também critica aqueles que confundem a natureza com o próprio Criador, como muitos panteístas fazem hoje. De certa forma, boa parte das religiões não-monoteístas acabam caindo nesse erro, assim como os defensores do naturalismo. Trocam o Pai Criador pela Mãe Natureza, esquecendo-se de que tudo "foi criado para manifestação da glória de Deus" (1.5.5, p.60) e que "é prejudicial envolver a Deus ambiguamente com o curso inferior de suas obras" (idem).
O governo, a soberania e o justo juízo de Deus são as próximas evidências que Calvino nos apresenta como revelação de Deus na Criação. É possível captarmos algumas características do Criador.
"Tem necessariamente de ser eterno e ter de si próprio o princípio donde todas as coisas derivam a origem. Ademais, se porventura se busca a causa, em virtude da qual não só foi ele uma vez levado a criar todas as coisas, mas ainda é agora movido a preservá-las, só em sua bondade acharemos estar sua causa." (1.5.6, p.61)
Citando o Salmo 107, Calvino mostra que Deus domina sobre a vida humana, fato que deve ser reconhecido por todos. Seu comentário é um desafio para os crentes atuais, que fazem rígida divisão entre natural e sobrenatural, sem perceber que Deus está trabalhando em tudo, não apenas nas intervenções miraculosas.
"Os fatos que se consideram ser eventos casuais são outros tantos testemunhos da providência celestial, na verdade especialmente da clemência paterna." (1.5.8, p.62)
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