"Na verdade, tanto quanto em outras circunstâncias, se pudesse haver dúvida acerca desta matéria, a mesma nos é dirimida por Paulo, onde, descrito o velho homem, que dissera ter sido corrompido pelas concupiscências do erro, ordena que sejamos renovados no espírito de nossa mente [Ef 4.22, 23]. Vês que ele não situa os desejos ilícitos e depravados apenas na parte sensorial, mas também na própria mente, e por isso requer que lhe haja renovação." (2.3.1, p.57)
A Bíblia é clara em afirmar que a parte imaterial do homem é fonte de pecado. Não derivamos nosso pensamento dos platônicos, mas de Deus. Mesmo o coração, considerado por alguns a melhor expressão do que é o ser humano, não escapa desse vírus implacável. "Em nada é mais branda a condenação do coração, quando se diz ser enganoso acima de todas as coisas e depravado [Jr 17.9]." (2.3.2, p.58). Para não se delongar muito nesse assunto, Calvino escolhe Romanos 3 como texto-base para demonstrar a nossa depravação. Temos uma citação longa, mas necessária.
"Ele priva o homem, de início, da justiça, isto é, da integridade e da pureza; a seguir, do entendimento [Rm 3.10, 11]. Ora, a carência de entendimento é demonstrada pela apostasia para com Deus, a busca de quem é o primeiro degrau da sabedoria. Mas essa deficiência necessariamente se acha naqueles que se têm afastado de Deus. Acrescenta em seguida que todos se têm transviado e se têm tornado como que putrefatos, que nenhum há que faça o bem; então adiciona as ignomínias com as quais contaminam a cada um de seus membros aqueles que uma vez se espojaram na dissolução. Finalmente, atesta que são vazios do temor de Deus, o que deveria ser a regra a dirigir-nos os passos." (2.3.2, p.59)
O reformador nos lembra que essa passagem trata de toda humanidade, e não apenas de alguns. Ele também afirma que, embora nem todos cheguem a cometer tamanhos males, essa semente pecaminosa deixa aberta essa possibilidade no coração de todo ser humano.
"Se forem estes os dotes hereditários do gênero humano, em vão se busca algo de bom em nossa natureza. Reconheço, sem dúvida, que nem todas estas abominações vêm à tona em cada ser humano, entretanto não se pode negar que esta hidra jaz oculta no coração de cada um." (idem)
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